José Maria Martins

Blogue do advogado José Maria Martins

sexta-feira, janeiro 30, 2009

Caso Freeport - A equipa mista proposta pelos ingleses e a teoria do "orgulhosamente sós" da PGR

No âmbito da apaixonada discussão do caso "Freeport" e , sobretudo, no debate sobre a eventual culpabilidade de José Sócrates, assistimos a factos suficientemente graves que devem merecer a nossa atenção especial.
Ao ouvir a Drª Cândida Almeida os portugueses ficaram perplexos. Parece muito claro que José Sócrates nunca será investigado em Portugal. É Primeiro Ministro, o PGR foi nomeado pelo Governo, a Drª Cândida Almeida parece aspirar a vir a ser PGR.
No entanto, tendo em atenção a posição das polícias britânicas há - pelo menos para eles - indicios suficientes para abrirem uma investigação envolvendo o PM português.
A Drª Cândida Almeida , ainda mais surpreendemente, disse à SIC que não era aceitável polícias estrangeiros investigarem o PM português!
Ora, este "orgulhosamente sós" choca com três ordens de razões:
1ª - Noriega era Presidente do Panamá , mas nem por isso deixou de ser destituído, julgado e encarcerado nos EUA;
2ª - Saddam Hussein, claramente ex-aliado dos EUA, não deixou de ser deposto, preso, julgado e enforcado;
3ª - A Comunidade Internacional tem regras que não param perante o PM do Estado menos desenvolvido da União Europeia, o mais dependente.
A constituição da equipa mista não foi aceite, também porque os sistemas português e britãnico são diferentes, como alegou a Drª Cândida Almeida.
Todavia esta posição da Drª Cândida Almeida carece de total razoabilidade.
Porque Portugal é membro da NATO e o Reino Unido também, Portugal é membro da União Europeia e o Reino Unido também. Em Portugal vigora a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no Reino Unido também. As polícias de ambos os países cooperam e entendem-se.
O facto de os sistemas serem diferentes não impediu a Inglaterra , aquando das invasões francesas em 1808, de ter protegido D. João VI, de o ter levado sob escolta da sua frota naval para o Brasil.
Depois a Inglaterra organizou as forças militares portuguesas e com cerca de 100 mil soldados portugueses derrotou as tropas de Napoleão.
Além disso Portugal é aliado do Reino Unido desde 1383/1385.

Os ingleses conhecem como ninguém a pequenez portuguesa e a dificuldade em levar Portugal para o bom caminho.
Aquando da formação da NATO os EUA e o Reino Unido tiveram um trabalhão enorme para convencer Portugal a abandonar conceitos surrealistas, como bem conta o Prof. Anónio José Telo , na obra "Portugal e a NATO".
A pouco e pouco os EUA e os ingleses foram impondo a sua visão e estratégia, apesar da enorme oposição de Salazar.
Mas calma e sabiamente foram moldando as nossas forças armadas, segundo modelos totalmente diferentes dos vigentes em Portugal.
Basta recordar que Portugal dizia ter capacidade para 10 divisões e nunca chegou a formar uma única , pois Santa Margarida nem concluído foi até à eclosão das guerras nas colónias!

No caso Freeport não tenho dúvidas que a Justiça do Reino Unido está no bom caminho. Acredito que o Reino Unido terá a paciência e a força suficiente para levar a investigação a bom porto.
A guerra de comunicados da PGR e as posições insustentáveis que a Drª Cândida Almeida , só contribuem para o isolamento de Portugal, para a falta de credibilidade do nosso sistema.
O que é muito perigoso, porque Portugal é um Estado sem recursos, totalmente dependente do estrangeiro em todos os aspectos: alimentar, energético, militar, económico, financeiro, laboral, de saúde, indústrial.
O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, em acórdão do Verão do ano passado, censurou o Ministério Público Português por ter uma posição em Portugal e outra totalmente diferente naquele Tribunal.
O "orgulhosamente sós" e a posição de nacionalismo injustificado de que nos deu conta a Drª Cândida Almeida , é extraordinariamente perigoso para os interesses de Portugal.
A ideia que ficou é que "todos são iguais perante a lei" mas José Sócrates pode estar descansado que não haverá investigação contra ele.É Primeiro Ministro.
Bom, não tenho a mínima dúvida que o Reino Unido vai retaliar e que os outros países da União Europeia não terão apreciado o "músculo" do Ministério Público Português., veja-se aqui:http://aeiou.expresso.pt/britanicos_contra_contratacao_de_portugueses_para_refinarias=f495023
Isto porque na União Europeia assiste-se com incredibilidade a esta posição, e, no confronto Portugal/Reino Unido os outros povos tenderão a acreditar na Justiça Britânica e não na Portuguesa, que perdeu credibilidade face a tantos escândalos que nunca deram em nada e que por isso denigrem a imagem do nosso Povo e do nosso Estado.
Os elementos que já vieram a público levariam qualquer cidadão , "normal" ,a já ter sido constituído arguido, talvez preso.
Seria bom que o Parlamento Europeu constituisse uma comissão de inquérito à forma como em Portugal o Ministério Público aplica a lei internacional a que estamos todos obrigados observar e, tomar medidas , como tomou no caso da Aústria, quando a direita ganhou as eleições e o PM foi obrigado a demitir-se.
Até seria bom que José Sócrates se lembrasse desse caso austríaco, para saber que o facto de ser PM não impede que a comunidade internacional tome medidas.
Por fim, não deixa de ser totalmente estranho aos novos ventos da história que Clinton tenha sido investigado por alegadamente ter tido sexo com uma funcionária da Casa Branca e o PM de Portugal não seja, quando estão em causa factos graves, que minam a credibilidade internacional do Estado Português, quando ele é manifestamente suspeito e está sob investigação no Reino Unido!


DEMOCRACIA, precisa-se!