José Maria Martins

Blogue do advogado José Maria Martins

quarta-feira, outubro 15, 2008

Guerra Colonial - Heróis e Não Heróis - Retalhos da História de Portugal.

O Site "portugalclub" emite a partir do Brasil e é um dos meios mais importantes na blogofesra no Mundo Português.

Dele publico uma entrevista com o Ten-Coronel Marcelino da Mata, um grande combatente na Guiné.

Portugal tem de recordar quem por ele se bateu em armas, nas muliplicas guerras em que que viu envolvido desde 1415, data da conquista de Ceuta, hoje uma mera colónia espanhola e que permitiram a existência da lusofonia, da lingua e cultura portuguesa, desde Timor ao Brasil, à Guiné e a S. Tomé e Principe, a Angola e Moçambique, à India, à China, ao Japão, à Malásia.

O meu irmão, furriel miliciano, voluntário, Victor Manuel Martins, lutou em Angola de Dezembro de 1965 - ou 1966 não me lembro bem - até 1968. A ele quero prestar homenagem ,uma vez que faleceu em 2006, publicando a entrevista abaixo.

Assim, e também por isso, publico abaixo uma entrevista , enorme, de um grande guerreiro.

Quem quiser aceder ao site deve apenas escrever "portugalclub" que aparecerá.

"Entrevista com o Ten-Coronel Marcelino da Mata (*)
(bloco 01)
P: É um oficial com o curso dos “Comandos”. Como entrou nos “Comandos”?
R: Em 1964, o Maurício Saraiva e eu demos instrução aos oficiais e sargentos, que iriam constituir alguns grupos de comandos.
O meu grupo designado por “Panteras” actuou na área de Pirada, com um alferes, que entretanto regressou à Metrópole por ter acabado a comissão. Quando o seu substituto chegou, ocorreram problemas entre nós e fui transferido para o Quartel-General, em Bissau. Aqui sentia-me muito frustrado, pois apenas me puseram a conduzir viaturas e eu queria era ser um operacional. Fui à 4.ª Repartição e disse ao capitão: “Eu não fico cá. Ou me mandam para uma zona operacional ou fujo daqui.”
Entretanto apareceu lá o Porfírio Pereira da Silva, que era o 2.º comandante do Batalhão de Caçadores n.º 1887, que perguntou se eu queria ir para Farim. Disse-lhe querer ir para Pirada, onde a guerra estava mais “assanhada”, mas aceitei ir com ele.
Naquela localidade, quando me apresentei ao comandante, o Ten-Coronel Agostinho Ferreira, afirmei-lhe querer formar um grupo de operações especiais. Ele não concordou…
Então para mostrar que podia fazer tal actuação, num determinado dia peguei em cinco homens e saí do quartel em direcção a uma base do PAIGC, situada a 3,5 Kms de Farim, numa destilaria de aguardente. Atacámos à noite e trouxemos nove presos, carregando 65 armas apreendidas. Às 6 horas da manhã já estava a bater na porta do quarto do comandante, a chamá-lo. Ele não queria aparecer, mas insisti. Quando surgiu, perguntou o que é que eu queria dele. Disse-lhe: “É para mostrar armas”. Ripostou: “E quais são as armas que eu não conheço?” Respondi: “Estas não conhece, pois são do PAIGC”. Espantado, perguntou-me como tinha sido a actuação. Respondi: “Olhe! Eu nunca digo como faço as minhas operações. Fui lá, matei alguns e trouxe estes.”
Disse ele: “Então deixa os prisioneiros andar com armas?”. Retorqui eu: “Não faz mal; então não são homens como nós?! …”

Na manhã seguinte, na estrada Farim – Jumbembém, vi que os tipos do PAIGC subiam às árvores e focavam o quartel todo. À tarde peguei na mota de um soldado fotógrafo, que tinha a alcunha de “brigadeiro” e fui ter com as sentinelas do lado donde eles faziam isso. Disseram: “São bandidos…, do PAIGC”.
Às 4 horas da madrugada peguei em seis homens e acabei apanhando cinco elementos do PAIGC. Quando cheguei perto do quarto do comandante, chamei por ele. Apareceu resmungando e quando lhe apresentei os indivíduos e o que andavam a fazer, disse: “Este tipo é tramado…”

No terceiro dia, quando me desloquei à pista de aviação de Farim, via-se, no final da mesma, um grupo de tipos do PAIGC armados com armas automáticas PP Sagal (metralhadoras com tambores de munições). Perguntei: “Então ninguém vai lá atacá-los? “ Disseram que não…
Fui falar com o chefe das milícias locais para me arranjar 12 homens. Depois fui ter com os cozinheiros, impedidos dos bares e outros assim e pedi-lhes as suas espingardas G3. Levei-as para minha casa onde foram todas bem limpinhas e carregámos com munições impecáveis…
Quando eram 23H45, furámos as duas fiadas de arame farpado e fomos apanhar a estrada para Jumbembém. Atravessámos o rio, demos a volta e fomos sair atrás deles. Ficámos lá instalados também com uma metralhadora e uma bazooca e, quando eram 4 horas, as armas começaram a “cantar”; foi um grande “arraial”… Apanhámos 60 tipos à mão, depois de termos morto cerca de 40. As armas capturadas foram 23. Fizemos o percurso inverso e entrámos no quartel através do arame farpado. E às 6H00 lá estava eu a bater outra vez à porta do comandante, tendo-se repetido as cenas dos dias anteriores.
No dia seguinte de manhã, chamou o 2.º comandante e disse: “ Diz lá àquele tipo que pode formar o grupo de operações especiais.” Foi a partir daí que formei o grupo “Os Roncos”.

Libertando prisioneiros no Senegal

P: Pretendia que avançássemos mais no tempo. Em 1970, tem alguma operação que queira destacar?
R: Nesse ano de 1970, na base do PAIGC, em Zinguichor, estavam sete militares portugueses presos (um furriel e seis soldados), com água pelo joelho nas celas, onde faziam tudo... Então veio um coronel do comando-chefe a propor a minha actuação para os libertar. Outro oficial contactou igualmente comigo. Comprometi-me a actuar, tendo-lhes pedido para não falarem nessa minha operação a ninguém.
Fomos apenas dois: eu e o Silva Indafá, com um embrulho com armas desmontadas e fitas de metralhadora; chegámos àquela localidade como contrabandistas, indo eu vestido com roupas compridas, estilo árabe, e calças por dentro. Entrámos dentro do quartel e começámos aos tiros. Foram abatidos bastantes elementos. Depois arrombámos a porta da prisão e chamei pelo nome do furriel, que perguntou quem eu era. Quando lhes disse ser o Marcelino da Mata saíram logo todos para fora daquele esterco, praticamente apenas em cuecas. Passámos por uma cantina onde arranjámos uns trapos para eles protegerem os pés, face à longa caminhada que nos esperava – cerca de 100 Kms. Andámos dois dias na mata e apesar da perseguição de um forte grupo do PAIGC, conseguimos atingir a fronteira junto de Guidage, com muito esforço e respondendo aos ataques dos guerrilheiros. Vieram, depois, uns helicópteros para transportar os militares para Bissau…

P: Ainda em Abril de 1970, ocorreu o caso da morte dos três majores, no chão manjaco. Também participou na reacção feita contra o PAIGC?
R: Sim. Andei, desde Teixeira Pinto até Farim, durante bastante tempo, a pé, na perseguição ao grupo que executou os nossos militares. Depois, soube-se que os tipos do PAIGC destinados a encontrarem-se com os majores não foram nesse dia ao encontro marcado e o grupo do André Gomes que ocasionalmente andava em patrulha naquela área, ao ver as nossas viaturas, fizeram o ataque e mataram todos, com excepção de um elemento que os acompanhava como intérprete, chamado Issufo e que ainda hoje reside em Bissau. Quando o Luís Cabral diz que mandou matar os majores, é mentira, pois não houve a intenção de fazê-lo…

A Operação de Invasão de Conakry

P: Avancemos para a Operação Mar Verde, de invasão da Guiné-Conakry. O que tem a dizer sobre os preparativos feitos?
R: Fui para a ilha de Soga em Agosto de 1970, isto é, três meses antes da sua execução. Fomos dar instrução aos tipos da “Front de Libertation” da Guiné-Conakry. O primeiro grupo destes elementos que detectei, surgiu junto da casa da minha mãe. Com aquele dialecto muito diferente, considerei ser muito estranho; então ia mandar chamar a PIDE, para os prender… Depois a meio do caminho arrependi-me. E ainda bem pois ia estragar a concentração para a operação. Quando contei ao Alpoim Calvão ele fartou-se de rir.
Fomos sete homens, incluindo eu e o Rebordão de Brito e demos a instrução até à partida para Conakry.
P: Nessa operação existiram falhas no cumprimento da tomada dos objectivos…
R: Claro! Os russos pagaram dinheiro a quem lhes forneceu a informação. Assim o Sékou Touré foi alertado para a invasão. Não vou dizer mais nada sobre isso…
P: O Luís Marinho no seu livro “Operação Mar Verde” diz que o Januário se entregou com os seus homens.
R: É mentira! Depois de quase todos terem voltado para os barcos, eu ainda estava em terra, e vi o Januário a fazer sinais com a sua lanterna, a partir do tarrafo. Às 3 horas e meia da tarde ainda ele lá estava Mas os fuzileiros navais tiveram medo, pois já havia grande tiroteio. Assim ninguém os foi buscar.
Eu também fiquei na beira-mar à espera e foi preciso ir lá o Rebordão de Brito buscar-me, cerca das quatro da tarde, pois os outros tiveram medo…
P: Porque é que ele o lá foi buscar?
R: Nós os dois é que tínhamos dado instrução àquela gente toda durante aqueles meses… A nossa relação era maior do que amigos. Nós éramos como irmãos. O meu grupo era constituído por nove elementos. Depois de ele (Rebordão) e um com alcunha do “Setúbal” me transportar e ao cadáver do alferes, ainda lá voltou para trazer o resto do grupo.
P: Qual era missão do Januário?
R: Era ficar no cruzamento a dar cobertura às outras equipas, com dois morteiros 82 mm, a disparar para o lado do quartel de Alpha Yaya, da tropa de Conakry e do quartel do PAIGC. Quem foi ao aeroporto foi o Cicri Vieira…
P: Houve problemas com mais alguém?
R: Antes da saída, o Leal de Almeida começou a chorar dizendo que não ia para Conakry para morrer, e que tinha mulher e filhos. Ele “borrou as calças”. Então o Calvão deu-lhe duas bofetadas e caiu junto da borda do patrulha.
Outro que creio também levou do Calvão foi o Capitão Morais. Mas esse foi ao objectivo, que era ir ao aeroporto rebentar com os Migs (não estavam lá). Ainda andou às costas do Cicri Vieira, pois teve um problema numa perna…
P: Luís Marinho, no referido livro, transcreve uma afirmação do comandante da Defesa Marítima, que disse ter o Marcelino da Mata morto 94 homens? É verdade?
R: Foi isso que eu disse, mas ao todo talvez seja o dobro. Eu tinha uma metralhadora de fitas, que utilizei bastante na entrada do quartel. Quanto ao Calvão ter ficado aborrecido comigo por ter morto tipos que estavam metidos no golpe, é verdade, pois alguns até eram generais… É que, logo de início, o alferes que comandava o meu grupo, foi morto com uma rajada. Era um principiante (“periquito”) que nunca entrara em combate. Então, fui eu a tomar conta do comando do grupo, constituído por nove homens. Tinham-nos dito que estavam lá apenas cerca de 40 homens. Afinal era um regimento, da considerada tropa especial, mas que actuaram como carneiros… Terão sido algumas centenas de mortos.
Em relação aos outros objectivos posso dizer que eu já tinha deitado abaixo uma emissora e o Calvão dizia que continuava a falar. Era a outra que devia ter sido rebentada pelo Jamanca. Ele quando lá chegou viu carabineros armados e teve medo.
O grupo que tinha como objectivo o Palácio do Presidente Sékou Touré não quis enfrentar a guarda que lá se encontrava e mandou apenas uma equipa (cinco homens) que foi dizimada, com excepção do Nanque; este conseguiu fugir a nado e, após alguns dias no mar, foi parar à costa de Marrocos. Depois andou pela Europa e só regressou à Guiné, mais de um ano depois.
Entretanto eu e os homens do meu grupo, tivemos que transportar o corpo do alferes para o cais, que ficava bastante longe. Utilizámos uma viatura, que no caminho avariou. Estávamos a ver os barcos já com a proa apontada ao ar…
Voltámos ao quartel e fomos emboscados por um grupo de militares da Guiné-Conakry; fizemos mais duas dezenas de mortos Nesta altura já estávamos sem comunicações rádio, pois o elemento que o transportava deixou-o cair na água.
Assim quando cheguei ao cais, já cerca das 3 horas da tarde, e como referi, foi o Rebordão de Brito que conseguiu voltar atrás para me levar.

P: Então o que passou com o Calvão quando lhe apresentou as divisas e galões dos 94 elementos mortos no quartel do Exército da Guiné-Conakry?
R: Eu não sabia das combinações feitas com o alferes e os tipos do “Front National”, que apenas era do seu conhecimento; lembro que ele foi logo morto na fase inicial. Também me recordo que o Alpoim Calvão não confiava em mim, pois andámos duas semanas (dia e noite) a discutir quem devia comandar o grupo que iria ao Palácio do Governo. Eu queria comandá-lo; no entanto acabou por nomear o João Bacar Jaló.
Quando disse que tinha morto aqueles indivíduos todos, o Calvão ficou danado… Eu afirmei-lhe: “Então você tinha-me dito alguma coisa? Eu não sabia de nada e o alferes não teve tempo para me dizer…”

Problemas com o General Spínola

P: Consta que teve problemas com o General Spínola. O que aconteceu na realidade?
R: Quando lá chegou em 1968, alguém lhe foi dizer que eu era um informador… Tinha ganho a Torre Espada, no tempo do General Arnaldo Schultz. Tal acontecera como resultado da minha actuação em Kumbamory (Senegal), em 1967. Foi a primeira vez, pois voltaria a actuar nessa base do PAIGC, também em Maio de 1973. Naquela altura, já possuía duas Cruzes de Guerra (uma de 1.ª classe e outra de 2.ª classe) e acabaria por ganhar a referida Torre Espada em 1969.
Recebi a missão de lá ir, quando comandava o “Grupo dos Roncos”. Veio um oficial chamado Camilo, a quem nós chamávamos Camelo… “Vais lá, onde apenas se encontram trinta homens…”. Afinal era um regimento: entre elementos do Exército do Senegal e tipos do PAIGC, deviam ser cerca de três centenas.
Nós éramos apenas nove e tivemos dois feridos ligeiros. Capturámos dois morteiros 82 mm, armas e metralhadoras, que vieram às costas de 16 prisioneiros…
Fui receber a Torre Espada ao Terreiro do Paço das mãos do Presidente da República, Almirante Américo Tomás.

P: Voltemos às suas relações difíceis com o General Spínola…
R: No tempo do General Schultz nunca fui punido. Com o General Spínola foi diferente. Como não gostava de mim, arranjava sempre qualquer motivo para me castigar. Lembro-me de um caso, em que corri com um tipo que estava a urinar junto da estrada onde estava a passar um casal…
P. Saiu de Farim em 1969. Para onde foi?
R: Fui para a 16.ª C.Cmds. comandada pelo Capitão Cmd Duarte de Almeida, que veio a morrer num quartel da GNR, na Ajuda, depois do 25 de Abril. Andámos por Teixeira Pinto, Bula, etc. Foram galardoados com uma Cruz de Guerra colectiva, que ajudei a ganhar com a minha participação nas operações…
Quando eles acabaram a comissão, (**) meteram-me na Engenharia.

Entretanto, depois de regressar de Conakry, ofereci-me para ir uns tempos para Angola. Em Janeiro de 1971, vim até Lisboa e daqui fui passar onze meses a Cabora Bassa, em Moçambique e não em Angola como pretendia. Lá, comparando com a Guiné, a actividade operacional era uma brincadeira… Depois o General Spínola enviou uma mensagem a mandar-me regressar à Guiné.

Nota: (*) Marcelino da Mata nasceu em 7-5-1940, na Guiné e foi incorporado em 3-1-1960, em Bolama. Condecorado com uma Medalha de Cruz de Guerra de 2.ª classe em 20-8-1966 e outra de 1.ª classe, em 20-6-1967, viria a ser distinguido com a Torre e Espada, Valor, Lealdade e Mérito em 10-9-1969. Foi ainda condecorado com duas medalhas de Cruz de Guerra de 1.ª classe, em 20-6-1971 e em 1-10-1973; e outra de 3.ª classe, em 15-9-1973, como alferes graduado.
(**) A 16.ª C.Cmds regressou a Lisboa em 24-6-1970.

Do PortugalClub:
Estamos divulgando em 03 grupos entrevista exclusiva ao livro "Gerra, Paz e fuzilamentosdos Guereiros" de autoria do Coronel Manuel Amaro Bernardo; de um verdadeiro e valente português, negro natural da Provincia ultramarina da Guiné Bissau. Muitos destes heróis foram covardemente entregues "para serem fuzilados) desarmados ao inimigo de Portugal, pelos traidores de 25a. Quando muitos traidores dizem que a Guiné era uma guerra perdida, vejam como estes heróis em grupos pequenos, iam resgatar portugueses prisioneiros nos países vizinhos.
No terceiro bloco chamo a extrema atenção para o tipo de oficial Comandante que foi Capitão Salgueiro Maia, que logo na chegada a guiné em seu 1º encontro com o inimigo, se "borrou, cagou de medo" fugiu , gritando para seus comandados " “salve-se quem puder”. Houve militares que apenas apareceram dois dias depois e outros que seriam apanhados e ficariam detidos nas prisões do PAIGC". depois devolvido a portugal, todo borrado, foi aclamado como herói nacional quando em cima de um carro de combate, quase foi responsavel por uma verdadeira tragédia nas ruas de Lisboa.
Nota Final:
Quem desejar ter conhecimento, verdadeiro da grande tragédia que aconteceu em 25a e como realmente aconteceu leiam os livros da coleção "História militar" da Autoria do Historiador - escritor Manuel Amaro Bernardo em especial "Guerra, Paz e fuzilamentos dos Guerreiros" e "Memórias da Revolução" pelo telefone 00351.213.143.378 ou editora.prefacio@mail.telepac".