José Maria Martins

Blogue do advogado José Maria Martins

domingo, outubro 22, 2006

A "coltura" e a "ética" do dinheiro

Parece que o dinheiro compra tudo: cavalos , parelhas e montes.

Aristófanes, um escritor grego , produziu uma das mais belas obras sobre a riqueza, o poder do dinheiro, obra denominada "Pluto", que em grego quer dizer dinheiro e riqueza.

Escreveu ele, num dado momento dessa obra, pondo em diálogo dois escravos e ele próprio:

"Pluto - Que dizes tu? É por minha causa que lhe fazem sacrifícios?

Crémilo - É o que te digo. E por Zeus, se há alguma coisa de brilhante, belo e agradável aos homens, é graças a ti que acontece. Tudo está submetido à riqueza.

Carião - Eu, por exemplo sou escravo por causa de meia dúzia de patacos, eu que antes era livre.


Crémilo - E dizem que as prostitutas de Corinto quando um pobre , por acaso, as tenta, nem sequer lhe prestam atenção. Mas se é um rico , logo lhe oferecem o cu."


Ora,

caros amigos, isto está hoje, quase 2.500 anos depois, igual.

O Dr. Moita Flores é co-autor de um livro sobre o escândalo sexual do Estado Novo,o aproveitamento por grandes senhores do regime da miséria das prostitutas e das filhas menores, que eram vendidas para o prazer dos valentões, ministros, banqueiros, padres e quejandos.

Escreve Moita Flores ( e Felicia Cabrita) num dado passo da obra "Ballet Rose", pondo em diálogo o agente da PJ , o Afonso , a quem foi distribuido o processo e que estava aflito, com o inspector da PJ , o doutor Josué , que lho mandou investigar:


" - Vossa Excelência leu os nomes que constam da informação?
- Li - Respondeu , imperturbável.

- Desculpe , eu sei que não é da minha conta, mas Vossa Excelência não acha que estamos a ir longe de mais? Há aqui nomes que são referências do regime, gente importante , poderosa. Não sei, senhor inspector!

O inspector Josué decidiu olhá-lo de frente.
-Está com medo?

-É muito perigoso, senhor doutor, e eu só tenho este emprego.Não sei fazer mais nada! - balbuciou, nervoso.

Fechou a caneta e olhou distraído para a janela. A pergunta colheu Afonso de surpresa.

- Tem filhos, Afonso?

-Desculpe, não percebi...

-Perguntei-lhe se tem filhos!

-Não , por acaso não - gaguejou.

- É pena . Talvez compreendesse melhor porque é que não podemos ficar de braços cruzados! - De repente as palavras tornaram-se metálicas - Quero descobrir tudo. Homens , mulheres, crianças. Quero aí preto no branco, quem dorme com mulheres, quem se deita com as miúdas, quanto pagam, onde o fazem e, sobretudo, perceber!...

-Afonso estava desorientado.

-Perceber?!...

-Perceber o prazer que alguém pode ter em prostituir crianças. Crianças, agente Afonso. Não lhe causa repugnância?

-Sim, claro.

-Então cumpra o seu dever ."

Bom, a verdade é que tudo isto é hoje igual.


Mudam-se os tempos mudam-se as vontades.

A choldra é a mesma. Os "senhores de qualquer regime" só clamam por justiça quando não são eles a estar na corda bamba.

Os escribas são sempre a voz do dono: de Pluto. Antes e hoje.